Blog da Marlizinha

domingo, 19 de junho de 2011

Estudando a intertextualidade:
prática de leitura e de escrita

Autor: Igor Caixeta Trindade Guimarães
Co-autor:Prof. Luiz Prazeres
Estrutura Curricular
Língua Portuguesa:
Linguagem escrita: leitura e produção de textos
Relações sociopragmáticas e discursivas
Dados da Aula
O que o aluno poderá aprender com esta aula:
Nesta sequência didática, o aluno poderá aprender, em relação à intertextualidade, a reconhecer aspectos evidenciadores de que textos de diferentes autores têm elementos comuns entre si.
Dentre esses aspectos, destacamos: formação ideológica e discursiva, seleção de temas, seleção de vocabulário e de estruturas linguísticas.
Duração das atividades
Aproximadamente três aulas de 50 minutos.
Conhecimentos prévios trabalhados pelo professor com o aluno
Nesta aula, devido à amplitude do tema, o conhecimento prévio necessário relaciona-se à experiência com leitura de textos diversos.
Assim sendo, mesmo que os textos apresentados não tenham sido trabalhados, o professor pode aproveitar a oportunidade para introduzi-los em sala, como novidade.
Por outro lado, caso os textos já tenham sido trabalhados, nesta aula, será estabelecido enfoque nas relações entre textos.
Estratégias e recursos da aula
ATIVIDADE I
Professor, para introduzir as primeiras ideias sobre a intertextualidade, sugerimos que você trabalhe com os alunos as imagens a seguir, baseadas no quadro de Leonardo da Vinci - A Monalisa.
Pergunte aos alunos o que significa cada uma delas, quando comparadas à pintura original.
Fonte: http://pink.dornbeast.com/?cat=97
Fonte: http://pink.dornbeast.com/?cat=97






ATIVIDADE II
Para o desenvolvimento desta atividade, o professor apresentará aos alunos três textos, disponíveis a seguir.
O primeiro deles é a fábula A Cigarra e a Formiga, por La Fontaine.
O segundo, uma versão dessa fábula escrita por Monteiro Lobato, em 1922.
E o terceiro texto, por fim, é outra versão dessa fábula, do escritor Millôr Fernandes, escrita em 2009 e publicada pela revista Veja.
O professor deverá pedir a leitura dos textos nessa ordem em que os apresentamos.
Logo após cada texto, há perguntas a que os alunos devem responder antes de passarem para a leitura do texto seguinte.
O professor deverá discutir com os alunos as respostas dadas por eles.
Logo após cada questão, apresentamos uma chave de resposta, em que o professor deverá se basear, quando for discutir as questões com os alunos.
TEXTO I
A Cigarra e a Formiga
Tendo a cigarra cantado durante o verão,
Apavorou-se com o frio da próxima estação.
Sem mosca ou verme para se alimentar,
Com fome, foi ver a formiga, sua vizinha,
pedindo-lhe alguns grãos para aguentar
Até vir uma época mais quentinha!
- "Eu lhe pagarei", disse ela,
- "Antes do verão, palavra de animal,
Os juros e também o capital."
A formiga não gosta de emprestar,
É esse um de seus defeitos.
"O que você fazia no calor de outrora?"
Perguntou-lhe ela com certa esperteza.
- "Noite e dia, eu cantava no meu posto,
Sem querer dar-lhe desgosto."
- "Você cantava? Que beleza!
Pois, então, dance agora!"
(Fábula de Esopo, por La Fontaine)
1) O texto tem como personagens uma cigarra e uma formiga, como o próprio título sinaliza.
De acordo com o desenrolar da narrativa, é possível identificar características comportamentais de cada uma dessas personagens.
Explicite essas características:
Chave de resposta:
A formiga trabalha, pensando em seu sustento e no mau tempo do porvir.
É individualista, pois não ajuda a cigarra.
A cigarra, por sua vez, prefere cantar a trabalhar e acredita que a formiga possa ser sua amiga, ajudando-a.
2) No final do diálogo, a formiga diz à cigarra: “Você cantava?
Que beleza! Pois, então, dance agora!”
A cigarra se sentiu bem diante dessa resposta? J
ustifique.
Chave de resposta
A cigarra não pode ter se sentido bem, uma vez que a resposta da formiga foi contra suas expectativas.
3) A fábula apresentada tem a seguinte moral: “Os que não pensam no dia de amanhã pagam sempre um alto preço por sua imprevidência.”
Você concorda com essa moral?
Justifique.
Resposta pessoal, em que o aluno deve utilizar argumentos, com base no texto e/ou em suas experiências, de forma a emitir opinião em que se percebe se ele concorda ou discorda dessa moral.
TEXTO II
A Cigarra e a Formiga (A Formiga Boa - Monteiro Lobato)
Houve uma jovem cigarra que tinha o costume de chiar ao pé do formigueiro.
Só parava quando cansadinha; e seu divertimento era observar as formigas na eterna faina de abastecer as tulhas.
Mas o bom tempo afinal passou e vieram as chuvas .
Os animais todos, arrepiados, passavam o dia cochilando nas tocas.
A pobre cigarra, sem abrigo em seu galhinho seco e metida em grandes apuros, deliberou socorrer-se de alguém.
Manquitolando, com uma asa a arrastar, lá se dirigiu para o formigueiro.
Bateu – tique, tique, tique...
Aparece uma formiga friorenta, embrulhada num xalinho de paina.
- Que quer? – perguntou, examinando a triste mendiga suja de lama e a tossir.
- Venho em busca de agasalho. O mau tempo não cessa e eu...
A formiga olhou-a de alto a baixo.
- E que fez durante o bom tempo que não construiu a sua casa?
A pobre cigarra, toda tremendo, respondeu depois dum acesso de tosse.
- Eu cantava, bem sabe...
- Ah!.. . exclamou a formiga r ecordando-se.
Era você então que cantava nessa árvore enquanto nós labutávamos para encher as tulhas?
- Isso mesmo, era eu...
Pois entre, amiguinha!
Nunca poderemos esquecer as boas horas que sua cantoria nos proporcionou.
Aquele chiado nos distraía e aliviava o trabalho.
Dizíamos sempre: que felicidade ter como vizinha tão gentil cantora!
Entre, amiga, que aqui terá cama e mesa durante todo o mau tempo.
A cigarra entrou, sarou da tosse e voltou a ser a alegre cantora dos dias de sol.

Do livro Fábulas, Monteiro Lobato, 1994.
4) O texto de Monteiro Lobato tem relação direta com a fábula lida anteriormente.
Que características esses dois textos possuem em comum, tendo em vista o enredo de cada um deles?
Chave de resposta:
Ambos os textos tratam de uma cigarra que canta e de uma formiga que trabalha.
No enredo de cada um deles, a cigarra recorre à formiga quando surge o mau tempo.
5) Apesar de possuir características comuns em relação à fábula, o enredo do texto de Monteiro Lobato apresenta algumas modificações.
Que modificações são essas?
Chave de resposta:
Ao contrário da fábula original, a versão de Monteiro Lobato explicita uma relação amistosa entre a formiga e a cigarra.
O chiado da cigarra soou agradável aos ouvidos da formiga, ao passo que, no texto original, a formiga foi indiferente a ela.
6) A moral da fábula aplica-se ao texto de Monteiro Lobato? Por quê?
Chave de resposta:
A moral da fabula não se aplica ao texto de Monteiro Lobato.
O texto de Monteiro Lobato traz uma perspectiva diferente sobre a relação trabalho X arte.
A música da Cigarra foi valorizada pela Formiga, o que significa que a ideia de trabalho sofreu uma alteração, tal como se o ato de cantar pudesse ser considerado um tipo de trabalho, e, portanto, ser também reconhecido.
Na fábula original, a música da cigarra não tinha importância alguma.
Ao contrário, significou a imprevidência da Cigarra.
TEXTO III
A CIGARRA E A FORMIGA (2009)
&n bsp; Millôr Fernandes
Cantava a Cigarra
Em dós sustenidos
Quando ouviu os gemidos
Da Formiga,
Que, bufando e suando,
Ali, num atalho,
Com gestos precisos
Empurrava o trabalho:
Folhas mortas, insetos vivos.
Ao ver a Cigarra
Assim, festiva,
A Formiga perdeu a esportiva:
"Canta, canta, salafrária,
E não cuida da espiral inflacionária!
No inverno,
Quando aumentar a recessão maldita,
Você, faminta e aflita,
Cansada, suja, humilde, morta,
Virá pechinchar à minha porta.
E, na hora em que subirem
As tarifas energéticas,
Verá que minhas palavras eram proféticas.
Aí, acabado o verão,
Lá em cima o preço do feijão,
Você apelará pra formiguinha.
Mas eu estarei na minha
E não te darei sequer
Uma tragada de fumaça!"
Ouvindo a ameaça,
A Cigarra riu, superior,
E disse com seu ar provocador:
"Você está por fora,
Ultrapassada sofredora.
Hoje eu sou em videocassete
Uma reprodutora!
Chegado o inverno,
Continuarei cantando
– sem ir lá –
No Rio,
São Paulo
Ou Ceará.
Rica!
E você continuará aqui
Comendo bolo de titica.
O que você gan ha num ano
Eu ganho num instante
Cantando a Coca,
O sabãozão gigante,
O edifício novo
E o des odorante.
E pos so viver com calma
Pois canto só pra multinacionalma".
(Fonte: Revista Veja , 08/07/2009, edição 2120)

7) O texto de Millôr Fernandes também trata de uma cigarra e de uma formiga.
Descreva o perfil das personagens segundo esse texto.
Chave de resposta:
No texto de Millôr Fernandes, a Formiga é uma pobre trabalhadora que enfrenta problemas de ordem econômica, como recessão e inflação.
Já a Cigarra, numa situação privilegiada, vive de cantar para comerciais (Coca, sabãozão gigante, edifício novo e desodorante), dos quais obtém um bom retorno.
Ambas as personagens trocam insultos uma com a outra.
8) Explique o que você entendeu do seguinte trecho:
“O que você ganha num ano
Eu ganho num instante
Cantando a Coca,
O sabãozão gigante,
O edifício novo
E o desodorante.
E posso viver com calma
Pois canto só pra multinacionalma".
Chave de resposta:
Esse trecho permite-nos interpretar que a Cigarra cantava como uma forma de ganhar dinheiro, fazendo comerciais para empresas multinacionais ou recebendo patrocínio delas.
9) Analisando as duas relações: da formiga com o trabalho, e da cigarra com a música, responda: que modificações o texto de Millôr Fernandes trouxe ao enredo da história, quando o comparamos aos dois textos anteriores?
Chave de resposta:
O trabalho da formiga, no texto de Millôr Fernandes, adquire um sentido de sacrifício.
A formiga precisa se esforçar para sobreviver, o que lembra o contexto socioeconômico brasileiro de exploração do assalariado.
Já a Cigarra trabalha cantando, o que para ela é grande lucro.
Sobretudo em tempos atuais, quando fazer música e conseguir lucro não demanda nem muita técnica nem muita inspiração.
10) Discuta com seu professor o sentido de “espiral inflacionária” e “recessão”.
Chave de resposta:
“A recessão é um período em que ocorre um grande declínio na taxa de crescimento econômico de uma determinada região ou país.
Resulta na diminuição da produção e do trabalho, dos salários e dos benefícios das empresas.
Do ponto de vista dos empresários, recessão significa restringir as importações, produzir menos e aumentar a capacidade ociosa.
Para o consumidor, significa restrição de crédito, juros altos e desestímulo para compras.
Para o trabalhador, baixos salários e desemprego”.
“Em economia, inflação é a queda do valor de mercado ou poder de compra do dinheiro.
Isso é equivalente ao aumento no nível geral de preços.
Inflação é o oposto de deflação. Inflação zero, ou muito baixa, é uma situação chamada de estabilidade de preços”.
Após discutir as questões propostas com alunos, o professor fará uma conclusão que deve ser dirigida de forma que os alunos apreendam o sentido dado ao conceito de intertextualidade. Acerca disso, damos algumas diretrizes:
Você pôde observar que os três textos tratam de um mesmo tema e têm uma narrativa semelhante. Os dois últimos text os se baseiam no primeiro, a antiga fábula A Cigarra e a Formiga.
Logo, esses textos dialogam entre si, mesmo que um autor tenha uma perspectiva diferente da do outro.
A esse diálogo entre textos chamamos de intertextualidade.
Ela está presente em nossa língua a todo momento, uma vez que nem tudo o que falamos ou o que escrevemos é original.
Além disso, os textos que produzimos circulam socialmente, podendo modificar-se com o tempo, de acordo com nossas ideias, nossa visão de mundo, nossas intenções.
Nesse momento, o professor deve solicitar aos alunos que indiquem outros textos em que percebem relação de intertextualidade.
Como exemplos, podem ser feitas referências a letras de música, a propagandas, a artigos de opinião, etc.
Recursos Complementares
Se for possível, o professor poderá mostrar aos alunos o vídeo disponível no seguinte endereço:
Trata-se de uma versão da fábula semelhante à de Millôr Fernandes.
Avaliação
Após realizar as atividades propostas, os alunos deverão ser capazes de compreender a intertextualidade e de identificar sua presença nos textos que lerão futuramente.
Com o objetivo de incentivar a prática de escrita dos alunos, apresentamos mais uma fábula, a seguir, e sugerimos, como avaliação, que os alunos escrevam individualmente uma versão diferente para ela, assim como Monteiro Lobato e Millôr Fernandes fizeram com a fábula A Cigarra e a Formiga.
É importante observar que a moral, fruto de uma ideologia particular, possa ser alterada de acordo com a visão de mundo do aluno.
TEXTO IV
A Leiteira e o Balde
Uma leiteira ia a caminho do mercado.
Na cabeça, levava um grande balde de leite.
Enquanto andava, ia pensando no dinheiro que ganharia com a venda do leite:
"Comprarei umas galinhas.
As galinhas botarão ovos todos os dias.
Venderei os ovos a bom preço.
Com o dinheiro dos ovos, comprarei um vestido e um chapéu novo.
De que cor?...
Verde, tudo verde, que é a cor que me assenta bem.
Irei ao mercado com o vestido novo.
Os rapazes me admirarão, me dirão galanteios e eu sacudirei a cabeça... assim!..."
...E sacudiu a cabeça.
O balde caiu no chão e o leite todo espalhou-se.
A leiteira voltou com o balde vazio...
Como critérios de avaliação, o professor deverá avaliar a coerência e a originalidade nos textos produzidos.
Antes de os alunos darem início à produção de texto, sugerimos que o professor, baseando-se na fábula A Cigarra e a Formiga, mostre aos alunos como cada autor foi original ao escrever seu texto, a partir da seleção de palavras diferentes e de estruturas linguísticas específicas.
Vejamos a introdução de cada um deles:
La Fontaine:
“Tendo a cigarra cantado durante o verão, apavorou-se com o frio da próxima estação.
Sem mosca ou verme para se alimentar, com fome, foi ver a formiga, sua vizinha, pedindo-lhe alguns grãos para aguentar...”
Monteiro Lobato:
“Houve uma jovem cigarra que tinha o costume de chiar ao pé do formigueiro.
Só parava quando cansadinha; e seu divertimento era observar as formigas na eterna faina de abastecer as tulhas...”
Millôr Fernandes
“Cantava a Cigarra em dós sustenidos quando ouviu os gemidos da Formiga, que, bufando e suando, ali, num atalho, com gestos precisos empurrava o trabalho...”

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